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Objeto

Objeto

Numa sala mal iluminada, onde a penumbra acariciava as paredes com um toque de mistério, uma tigela repousava no centro de uma mesa de vidro. Uma tigela vazia, ansiosa por ser preenchida por qualquer cor, exceto aquelas que preferia evitar. Uma metáfora para a mente de alguém que se escondia da própria verdade, desejando se preencher com tudo, menos o que realmente importava.
A música suave, quase imperceptível, ecoava pela sala. Era a voz de um cantor, sua melodia carregando palavras que tinham o poder de seduzir e confundir. Cada nota se misturava com a respiração do orador, cujas palavras, mal faladas e cheias de promessas vazias, deslizavam pelo ambiente como um amante infiel.

Enquanto isso, na tela, um filme de sacanagem multirracial e multivirtual desenrolava-se, preenchendo a sala com gemidos e risos artificiais. O gosto de gozo, metálico e amargo, persistia na boca, uma lembrança de prazeres momentâneos que não conseguiam saciar a fome por algo mais profundo.
A dona do cabaço dos meninos e das asperezas dos frustrados era uma figura ambígua, uma mulher de múltiplas faces e intenções. Ela se perdia na melodia, buscando encontrar a si mesma, tentando compreender como se havia perdido em meio a um mundo de ilusões. Cada nota da música parecia uma gota de chuva que prometia diluir suas lágrimas, trazendo uma espécie de purificação.

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Esperando a chuva chegar, ela sentia uma estranha inquietação. O bater de um coração ecoava em seus ouvidos, mas não era o seu próprio. Era um pulsar distante, uma lembrança de um amor perdido ou de um desejo não correspondido. Nisto! A exclamativa vibração de um sentimento que nunca pôde ser plenamente entendido ou alcançado.
Decidiu sair, passear pelas ruas, buscando na noite respostas que a sala não podia lhe dar. As ruas estavam cheias de vozes, algumas contando piadas, outras lançando insultos. Cada palavra era uma faca, cortando através da máscara de indiferença que ela usava. E, no entanto, cada golpe também a fortalecia, tornando-a mais consciente de suas próprias vulnerabilidades e desejos.

Enquanto caminhava, a chuva finalmente começou a cair, diluindo não apenas suas lágrimas, mas também as cores que evitava. A tigela vazia dentro dela começou a se preencher, não com as cores temidas, mas com uma paleta de tons inesperados, misturando alegria e dor, prazer e arrependimento.

O coração que batia não era dela, mas a chuva, agora transformada em uma sinfonia de gotas, lhe ensinou que o verdadeiro pulsar da vida vem de aceitar todas as suas cores, sejam elas preferidas ou não. A tigela vazia, finalmente, encontrou sua completude na aceitação do caos e da harmonia, da realidade e da fantasia.

Em meio à melodia suave da chuva, continuou a caminhar pelas ruas, sentindo-se mais inteira e, paradoxalmente, mais livre. O mundo, com todas as suas piadas cruéis e insultos dolorosos, se tornava um palco onde ela podia dançar ao som de sua própria música, descobrindo que o verdadeiro prazer estava em se encontrar, mesmo quando perdida.

Renato Pittas:

Contato:[email protected]   

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