Meu Deus do Céu, Que Música é Essa?
Meu Deus do Céu, que música é essa? Ops… Ato falho. Um ateu como eu falando isso… Mas essa interjeição foi necessária para expressar a sensação sobre “God”, segunda faixa do disco “High Level Low Profile” da banda CaSch, formada pelos Schevano brothers, Marcello e Ricardo e o indestrutível, infalível, e nunca invisível Rolando Castelo Júnior, fartamente conhecido como o Senhor Patrulha do Espaço. Credenciais, portanto, a banda tem e esbanja.
Desde o primeiro momento que escutei esse disco, sempre retornava a essa faixa, apesar do disco inteiro ser maravilhoso, onde Marcello Schevano, músico multinstrumentista voa mais alto ainda que em todas as bandas que tocou e toca, cantando, tocando guitarra e a tecladeira toda. A musicalidade do disco, que remete à do som produzido nos anos setenta e oitenta com uma energia que parece estalar de tanto que pulsa.
Sobre o disco já escrevi em 2019 (AQUI) quando chegou minha cópia, mas o que há algum tempo sinto necessidade é de falar sobre uma música especificamente, que escuto quase que diariamente nos últimos anos, e não canso: “God”. Musicalmente é uma viagem, com mudanças de ritmo e clima, que vão desde a introdução com teclados cheio de efeitos e timbres que lembram muito as bandas progressivas do passado, indo para um instrumental pesado onde é, feito a moldura de quadro, encaixada a letra. E não pense que “God” é uma letra chinfrim com teor cristão. Muito pelo contrário, a letra é forte, com questionamentos sobre fé, Deus e sobre a velha questão: quem somos nós nessa porra toda?
Em “God” Schevano solta a goela e coloca muita força nas palavras que canta. Versos como: “In The Name Of God / We´re Gonna Kill Us All” (Em nome de Deus / Nós vamos todos nos matar), “Who Is This Almighty God / Who I’m Gonna Die And Kill For…” (Quem é esse Deus todo-poderoso / Por quem vamos morrer ou matar?) já dão uma ideia do teor da letra, escrita pelo Rolando Castello Júnior.
Durante toda a letra/poesia, o eu lírico questiona que deus é esse, que permite que filhos sejam criados órfãos, a tortura, o estupro; e conclui que em nome de Deus é que não há paz, apenas dor, na humanidade. E pede para que o deixe em paz, vivendo no pecado e sem remorso. (Aliás, o remorso nada mais é do que uma criação das religiões judaico-cristãs). E torna a questionar sobre que deus é esse, todo-poderoso, pelo qual se mata e se morre. Por fim pergunta, por que tantos deuses para uma única raça humana?
Todo o enredo de “God” abre um leque enorme de interpretações e questionamentos, que permeiam a humanidade desde os tempos remotos, com guerras e violência de toda sorte, a respeito da questão religiosa. Nele, o autor da poesia/letra coloca toda sua revolta com as injustiças e violências cometidas “em nome de Deus”. Algo para se ouvir/ler e pensar.
Entretanto, a parte final foi a que mais me pegou: “So please help me God / Save me from God / In the name of God” (Então, por favor, me ajude Deus / Salve-me de Deus / Em nome de Deus). Ou seja: ele pede a Deus que o salve de Deus. Em nome de Deus. Isso tudo dentro de uma mudança total de clima, das guitarras, baixo e bateria pesados e rápidos para um piano que soa quase como angelical, remetendo mesmo a ideia de uma súplica. Aí a tecladeira corre solta e Rolando soca o braço na bateria, sua marca característica, acompanhado pelo baixo pulsante do Ricardo. Dá-lhe porrada!
E assim terminam os mais de 9 minutos dessa música simplesmente arrebatadora, que quanto mais eu escuto mais me envolvo e mais gosto. Aliás, diga-se de passagem, “God” é uma letra corajosa, que quebra muitos tabus, tascando o dedo na ferida do fanatismo religioso que tanta coisa ruim, há séculos, causa à humanidade.
Em resumo: “God”, da banda CaSch merecia um destaque melhor,pela letra tanto quanto pela qualidade musical. Aliás, todo o CD “High Level Low Profile” merecia um tratamento melhor por parte das chamadas mídias especializadas. Não entendo como um trabalho como esse, com músicos e produção de altíssima qualidade, e ainda mais cantado em inglês não explodiu internacionalmente. Esse trio, fosse americano ou europeu decerto estaria nos mais altos degraus do panteão do Rock.
A propósito, um detalhe, que pode ou não ter uma ligação com essa música: a arte da capa ostenta uma moeda estilo antigo, onde está gravado “In CaSch We Trust” (Em CaSch Nós Confiamos), uma alusão à inscrição nas moedas americanas (“In GOD We Trust”) Mera coincidência?
28/03/2024
Fonte : Barata Verso
Autor : Barata Cichetto
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