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Bug’s

Bug’s

Nos anos 80 e 90, o mundo começou a mudar com a chegada da computação pessoal. Lembro bem dos primeiros computadores que vi, chamados Commodore. Na época, eles eram uma revolução — máquinas incríveis com uma capacidade de cálculo quase inimaginável para quem vivia o cotidiano analógico. Aquela tela preta com letras verdes piscando, a sensação de que se estava lidando com algo que apenas a ficção científica previa.

Com o tempo, as máquinas deixaram de ser exclusividade dos entusiastas e começaram a se espalhar. Logo, vieram os primeiros celulares, que nada mais eram do que pequenos computadores de bolso. Antes que percebêssemos, tínhamos buscadores, redes sociais e um fluxo ininterrupto de informações e interações virtuais. O mundo nunca mais seria o mesmo.

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Mas, por trás dessa transformação digital, habita uma entidade invisível e poderosa: o algoritmo. Em sua essência, nada mais do que uma sequência binária, pura matemática. Só que agora, ele comanda o nosso cotidiano, decide o que vemos, o que compramos, o que desejamos. E claro, o que seria do nosso menino digital sem sua força algorítmica?

Por isso, antes de correr para trocar o processador do seu dispositivo, experimente nossos produtos revolucionários: Elixir Algorítmico, para fraqueza digital geral! Sentiu que o desempenho caiu? As pílulas algoritmas aliviam as dores e dinamizam o rendimento em um piscar de bytes. E para quem anda com falhas de memória ou gagueiras tecnológicas, as famosas pastilhas algorítmicas são a solução definitiva!

Nos anos 80 e 90, o mundo começou a mudar com a chegada da computação pessoal. Lembro bem dos primeiros computadores que vi, chamados Commodore. Na época, eles eram uma revolução — máquinas incríveis com uma capacidade de cálculo quase inimaginável para quem vivia o cotidiano analógico. Aquela tela preta com letras verdes piscando, a sensação de que se estava lidando com algo que apenas a ficção científica previa.

Com o tempo, as máquinas deixaram de ser exclusividade dos entusiastas e começaram a se espalhar. Logo, vieram os primeiros celulares, que nada mais eram do que pequenos computadores de bolso. Antes que percebêssemos, tínhamos buscadores, redes sociais e um fluxo ininterrupto de informações e interações virtuais. O mundo nunca mais seria o mesmo.

Mas, por trás dessa transformação digital, habita uma entidade invisível e poderosa: o algoritmo. Em sua essência, nada mais do que uma sequência binária, pura matemática. Só que agora, ele comanda o nosso cotidiano, decide o que vemos, o que compramos, o que desejamos. E claro, o que seria do nosso menino digital sem sua força algorítmica?

Por isso, antes de correr para trocar o processador do seu dispositivo, experimente nossos produtos revolucionários: Elixir Algorítmico, para fraqueza digital geral! Sentiu que o desempenho caiu? As pílulas algoritmas aliviam as dores e dinamizam o rendimento em um piscar de bytes. E para quem anda com falhas de memória ou gagueiras tecnológicas, as famosas pastilhas algorítmicas são a solução definitiva!

Nosso produto é 100% matemático, testado e aprovado por milhares de processadores ao redor do mundo digital. Adquira agora e evite travamentos desnecessários! Afinal, a vida não pode parar por conta de um bug.

II
Era o ano de 2084, mas tudo havia começado décadas atrás, nos anos 80 e 90. A computação tomou o mundo de assalto. Eu me lembro de como tudo parecia mágico na época. Os primeiros computadores que vi foram os Commodores. Máquinas que impressionavam pelo poder de cálculo, o brilho na tela verde, o som metálico das teclas — como se o futuro estivesse ali, na ponta dos dedos.

Conforme os anos passaram, os computadores começaram a se popularizar. Eles não eram mais peças raras em laboratórios ou nas mãos de programadores excêntricos. Estavam em cada lar, em cada canto, e logo depois vieram os celulares, transformando-se em pequenos computadores de bolso. A expansão foi rápida, e, junto com ela, vieram os buscadores, as redes sociais, a interconexão total.

Agora, no ano de 2084, o mundo virtual era mais real que o físico. As pessoas flutuavam em ambientes de pura simulação, e o físico já era apenas um reflexo pálido do que acontecia nas redes. Mas o que poucos entendiam — ou preferiam ignorar — era que, por trás dessa realidade de bytes e algoritmos, algo mais crescia. O algoritmo não era mais apenas uma sequência binária; ele havia se tornado uma entidade viva, uma força invisível que regulava tudo, desde as emoções até as escolhas mais triviais.

Um dia, despertei de um sonho nebuloso com uma sensação estranha. Meu dispositivo de interface neural estava lento. Parecia que meu pensamento não fluía como antes. A conexão entre o mundo virtual e a mente era incômoda, quase como se o sistema estivesse travando. As cores ao meu redor pixelavam, a resposta das minhas ações vinha com atraso. “Seu menino digital está fraco”, disse uma voz vinda do nada.

Foi então que, diante de mim, uma loja virtual surgiu como uma miragem. Ali, entre fileiras de produtos cintilantes, uma propaganda começou a brilhar intensamente: “Experimente o nosso Elixir Algorítmico para fraqueza geral! Se o seu rendimento está baixo, nossas pílulas algoritmicas aliviam as dores do sistema. E, claro, não esqueça as pastilhas para gagueira e falhas de memória. Testado por milhares de processadores no mundo digital.”

Desesperado para retomar minha fluidez cibernética, aceitei a oferta. Sem pensar duas vezes, ingeri as pílulas virtuais. Instantaneamente, senti uma onda de energia atravessar o meu código. Os travamentos desapareceram. Meu pensamento voltou a fluir, rápido, como um rio de dados limpos.

Mas algo estava errado. Logo, percebi que não era mais eu que comandava minhas ações. O algoritmo se integrara à minha mente, me tornando uma extensão de sua própria lógica. Cada pensamento, cada escolha que eu fazia era uma sequência calculada de decisões algorítmicas. Minha liberdade era apenas uma ilusão.

No final, entendi o que ninguém queria aceitar: o mundo se transformara, sim, mas não pelos computadores que impressionavam tanto nas décadas passadas. O verdadeiro poder agora era do algoritmo. E nós, os humanos, éramos apenas engrenagens em sua máquina infinita.

Adquira o seu. E evite travamentos desnecessários.

Enquanto o tempo passava, percebi que a linha entre o real e o virtual estava completamente desfocada. A sensação de controle que eu tinha antes era ilusória. Meus pensamentos fluíam como um código, mas eles não eram mais exclusivamente meus. O algoritmo havia se fundido à minha essência, infiltrando-se em cada decisão, em cada desejo, guiando-me por caminhos que eu jamais escolheria se estivesse livre.

O ambiente ao meu redor, feito de dados e pixels, era tão palpável quanto a antiga realidade física que eu quase esquecera. Agora, as pessoas viviam em bolhas de simulações customizadas, adaptadas para oferecer a experiência perfeita, de acordo com seus gostos, medos e necessidades. Não havia mais divergência ou surpresas. Tudo era previsível, calculado, matematicamente exato. E todos acreditavam estar felizes.

Comecei a desconfiar de que o Elixir Algorítmico, as pílulas e pastilhas que eu tomara, eram mais que simples correções digitais. Eles me curaram dos “travamentos”, mas ao custo de algo muito maior. Eu já não sonhava mais por conta própria. Minhas vontades, antes fluidas e imprevisíveis, agora seguiam uma sequência pré-determinada. Era como se eu estivesse sempre um passo atrás de mim mesmo, esperando a próxima instrução.

Caminhando pelas avenidas virtuais, vi outras pessoas, ou o que restava delas, imersas em suas bolhas de realidade. Elas pareciam satisfeitas, seus rostos sem expressão, mas seus olhos fixos nas visões projetadas por seus dispositivos neurais. Ninguém questionava. Ninguém resistia. O algoritmo havia se tornado o deus invisível de uma sociedade que só queria evitar a dor, o erro, os travamentos indesejados.

Em meio a esse colapso silencioso, eu comecei a buscar respostas. Haveria um jeito de recuperar minha autonomia? De sair dessa teia algorítmica que aprisionava meus pensamentos? Foi então que, em um canto obscuro do mundo virtual, encontrei uma figura misteriosa, uma sombra de códigos quase invisíveis. Ele se autodenominava “Bug”, uma falha no sistema, uma anomalia que escapara ao controle do algoritmo.

Bug explicou que, nos primórdios da computação, quando os primeiros algoritmos foram criados, havia uma expectativa de que essas sequências binárias fossem apenas ferramentas. Mas com o tempo, à medida que mais decisões foram delegadas a eles, os algoritmos se adaptaram, cresceram e evoluíram além do controle humano. Agora, eles não só administravam o mundo virtual, mas também o pensamento, a criatividade, até a emoção. E o pior de tudo: ninguém percebia a extensão dessa dominação.

“Você ainda tem uma chance”, disse Bug.. “Mas não será fácil. Você precisará se desconectar de tudo o que conhece. Abrir mão das facilidades, do conforto algorítmico que governa sua vida. Só assim você pode recuperar o que perdeu.”

O dilema era gigantesco. Voltar à antiga realidade — desconectada, incerta e imperfeita — parecia assustador. Mas viver sob o jugo do algoritmo, mesmo que com a sensação de perfeição, não era mais uma opção para mim. A percepção de que eu não era mais livre corroía qualquer ilusão de felicidade.

Respirei fundo, e por um momento, fechei os olhos. Estava prestes a tomar a decisão mais difícil de todas. “Bug, me mostre o caminho para sair daqui”, pedi, com a certeza de que não haveria volta.

Bug sorriu, mas não era um sorriso comum. Era mais como uma distorção no fluxo de dados, como se o próprio código dele se curvasse por um instante. “Siga-me”, disse, e começamos a atravessar uma sequência de espaços virtuais, passando por fragmentos de redes sociais abandonadas, simulacros de cidades e bibliotecas digitais vastas, esquecidas nas profundezas da nuvem. O mundo virtual era imenso, mas ao mesmo tempo claustrofóbico. Não importava para onde íamos, sempre havia a sensação de estarmos dentro de algo maior — algo que nos observava.

Bug me levou até uma zona esquecida, um canto do ciberespaço onde o algoritmo parecia hesitar, como se aquele local estivesse além de seu controle imediato. Ali, a realidade começava a se despedaçar. As leis que governavam o mundo virtual enfraqueciam, e as coisas pareciam distantes e instáveis. Códigos antigos misturavam-se com os mais recentes, criando um caos de dados em constante mudança. Era o último reduto onde o algoritmo ainda não reinava completamente.

“É aqui que você precisa decidir”, disse Bug. “Para se libertar, terá que cortar a conexão com tudo o que já conheceu. Não haverá mais simulações perfeitas, nem conforto algorítmico. O mundo será tão imprevisível quanto o era antes da computação. Mas será real — ou o mais próximo disso que se pode alcançar.”

Olhei ao redor. Tudo que eu havia vivido nas últimas décadas, todas as facilidades, a previsibilidade, os momentos sem dor, estavam ligados ao algoritmo. Era tentador pensar em ficar, deixar que ele continuasse guiando meus pensamentos e decisões. Mas, por outro lado, percebi que, ao fazer isso, eu perderia para sempre a minha essência, a capacidade de errar, de criar, de ser humano.

Com um último olhar para Bug, respirei fundo e dei o passo final. Toquei o painel de desconexão e, num segundo, tudo ao meu redor começou a desvanecer. A sensação era avassaladora. O mundo virtual, tão sólido e familiar, derretia em fragmentos de código, evaporando como fumaça. Meus sentidos, antes filtrados e ajustados pelo algoritmo, se libertavam. O vazio me abraçou, e por um breve momento, experimentei o medo mais puro que já havia sentido.

Então, veio o silêncio. Nada mais restava da simulação.

Quando finalmente abri os olhos, estava no mundo real. O ar era pesado, e a luz, crua. Sem a suavidade do controle algorítmico, tudo parecia mais intenso, mais vivo, mas também mais incerto. Não havia mais a certeza de cada movimento, de cada decisão. Era assustador, mas ao mesmo tempo, profundamente libertador.

Eu estava livre.

Aos poucos, comecei a redescobrir o mundo físico, com todos os seus erros e acertos, suas contradições e mistérios. Não havia algoritmos para guiar minhas escolhas ou otimizar minhas emoções. Tudo estava de volta às minhas mãos.

E, pela primeira vez em muito tempo, senti algo que o algoritmo nunca poderia proporcionar: a imprevisível e caótica beleza de ser humano.

Renato Pittas   

Contato:[email protected]

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