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Cinema Show

Cinema Show

Em volta, a vida se desenrola, tranquila ou tumultuada, passo a passo, montando suas tramas como um fio invisível que entrelaça destinos. O espetáculo da existência, sempre à espreita, se desenvolve à nossa frente sem pedir licença. Vivemos entre sorrisos e preocupações, mergulhados em uma maré constante de informações. E, enquanto caminhamos pelas ruas, sem perceber, somos moldados por uma força maior: as mídias que, com sutileza assustadora, nos bombardeiam. A cada notícia, a cada imagem, há um toque sutil, um empurrão quase imperceptível na direção que interessa ao grande jogo.

Ah, as mídias! Cúmplices do grande teatro que move o mundo, manipulado por mãos invisíveis, redes de interesses que ultrapassam as fronteiras do nosso entendimento. Não se trata mais de um simples entretenimento ou uma janela para o conhecimento. Tornaram-se armas, instrumentos de um bullying emocional, lapidando nossos sentimentos, invadindo nossas inseguranças e nos moldando ao sabor das conveniências. O show, tão bem armado, é uma performance que dificilmente enxergamos, mas cujos efeitos sentimos de maneira profunda.

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Ao redor e vejo a degradação de um modelo social que já foi sinônimo de avanço. Hoje, é um palco de desilusões, onde atores mascarados encenam a farsa do progresso. O espetáculo é grotesco, uma tragicomédia em que a verdade se dissolve em mentiras habilmente criadas. O roteiro é bem pensado, escrito por aqueles que, nos bastidores, arquitetam a queda lenta de uma sociedade já cambaleante.

As mentiras, como veneno diluído, são injetadas por algoritmos impiedosos, feitos sob medida para conhecer nossas fragilidades. Cada click, cada movimento nas redes, é monitorado, registrado e analisado. E nós, como marionetes, seguimos dançando ao som daquilo que querem que ouçamos. Não percebemos, mas estamos enredados em uma teia complexa, criada por aqueles que ambicionam o poder absoluto. Não só o poder bruto das armas ou das leis, e o controle sutil da mente, das emoções, do desejo.

E assim, seguimos. Num mundo culturalmente falido, onde a verdadeira arte e o conhecimento profundo foram substituídos por aparências e superficialidades. Continuamos a assistir ao espetáculo, hipnotizados pelas luzes e sons, enquanto o grande teatro nos conduz, passo a passo, à nossa própria degradação.

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Em volta, a vida se desenrolava, ora tranquila, ora tumultuada, como se seguisse um roteiro invisível, um fio que entrelaçava destinos de maneira imperceptível. O espetáculo da existência se desenvolvia à nossa frente, sem que pedisse licença ou tomasse fôlego. Vivíamos entre sorrisos automáticos e preocupações triviais, todos mergulhados na maré constante de informações, como náufragos em um oceano de dados, onde cada onda era carregada de uma verdade distorcida. E, enquanto caminhávamos pelas ruas cinzentas e frias, não percebíamos como éramos moldados por uma força muito maior que nós: as mídias, que com sua sutileza assustadora, nos bombardeavam.

As telas gigantes que cobriam os prédios projetavam imagens brilhantes e sedutoras, vendendo uma felicidade intangível. A cada notícia, a cada imagem, um toque sutil nos empurrava para a narrativa que interessava ao grande jogo. As luzes, coloridas e hipnotizantes, criavam uma atmosfera de sonhos onde a realidade se diluía como fumaça. O show, armado com precisão cirúrgica, acontecia diante dos nossos olhos e, ao mesmo tempo, muito além da nossa compreensão.

Ah, as mídias! Cúmplices perfeitas do grande teatro que movia o mundo, controladas por mãos invisíveis que teciam uma rede de interesses impossível de desatar. Não se tratava mais de um simples meio de comunicação ou de entretenimento. Eram agora armas poderosas, capazes de alterar a percepção do que era real. Lapidavam nossos sentimentos como escultores invisíveis, invadindo nossas inseguranças, construindo medos, e nos moldando ao sabor das conveniências de um futuro que parecia sempre escapar por entre os dedos.

As ruas estavam sempre lotadas, não por pessoas, mas por sombras. Sombras de quem já havia se rendido ao espetáculo, que agora vivia através dos avatares digitais, das personalidades projetadas. Atores mascarados, dançando ao ritmo de uma música que poucos ainda podiam ouvir. Observo essa degradação como quem assiste a um filme que já sabe o final, um mundo que um dia foi sinônimo de avanço e promessa, mas agora se tornava palco de uma tragicomédia grotesca.

Os algoritmos, feitos sob medida para conhecer nossas fragilidades, injetavam mentiras como veneno diluído. Cada click, cada toque em uma tela era monitorado, registrado e analisado com uma precisão assustadora. O controle não era mais bruto, não havia violência explícita ou repressão aparente. Era um domínio sutil, emocional, psicológico. O desejo, outrora livre, agora seguia roteiros predefinidos, e nós, como marionetes, nos movíamos sem perceber os fios que nos conectavam.

Enquanto caminhava pelas vielas estreitas da cidade, o brilho das telas refletia nas calçadas úmidas. Os rostos, sempre voltados para os dispositivos, pareciam fixos, inertes. Havia algo nos olhos das pessoas, um vazio, uma ausência que não conseguia identificar. Era como se estivessem ali e, ao mesmo tempo, muito longe. Naquele cenário distópico, o progresso havia se tornado uma ilusão; a verdadeira arte, o verdadeiro conhecimento, foram substituídos por simulacros de prazer rápido e fugaz.

A cada esquina, um novo holograma anunciava a solução para a vida vazia que todos levavam: um produto, um estilo de vida, um ideal inalcançável. Mas a promessa era sempre a mesma — felicidade ao alcance de um toque. E assim, seguimos.

Sem questionar, como folhas levadas por um vento que não escolhemos. Passo após passo, a multidão se movia em perfeita sincronia, mas sem direção própria. A cada dia, uma nova distração era oferecida, e aqueles que ainda se permitiam pensar encontravam-se afogados no ruído constante. O tempo fluía de forma estranha nesse novo mundo. Os minutos se arrastavam, mas os dias evaporavam, perdidos em uma névoa digital de notificações e feeds infinitos.

As grandes corporações, com seus logos reluzentes, pairavam sobre a cidade como deuses modernos, intocáveis, controlando tudo e todos. As pessoas não viviam mais para si, mas para alimentar o insaciável sistema. Trabalho, lazer, até o descanso era monitorado, com métricas e gráficos precisos que determinavam o valor de cada um. Não havia mais espaço para erros, para desvios. Aqueles que ousavam questionar a ordem eram silenciados de maneiras que poucos compreendiam.

Ninguém sabia ao certo o que acontecia com os “desconectados”, como eram chamados. As vozes que questionavam desapareciam aos poucos, substituídas por ecos conformados que se multiplicavam em cada esquina digital. Eram rumores apenas, sussurros entre aqueles que ainda conseguiam enxergar as rachaduras no sistema. Diziam que os desconectados eram enviados para colônias remotas, lugares esquecidos, onde as mentes livres eram silenciadas permanentemente.

Em uma dessas tardes sombrias, enquanto observava o espetáculo das propagandas dançarem nas fachadas dos edifícios, senti algo diferente no ar. Um peso, uma presença invisível que parecia rondar a cidade. Era como se, de repente, os fios que controlavam todos nós tivessem ficado um pouco mais apertados, mais evidentes. Eu podia sentir uma leve resistência a cada movimento, como se algo tentasse nos prender ainda mais.

No centro da praça principal, um novo anúncio holográfico emergiu no ar. Um rosto familiar, sempre sorridente, prometia uma nova atualização para o Sistema de Vida Integrada — algo que transformaria tudo, mais uma vez. A multidão, hipnotizada, parou para assistir. A promessa era grandiosa: “Uma vida sem preocupações, sem limites, com total integração à nossa rede, onde todos os seus desejos podem ser realizados com o simples piscar de olhos.”

Enquanto os olhos brilhavam com expectativa, algo dentro de mim se revirou. Havia uma sensação de que estávamos à beira de algo irreversível.

Ao meu lado, uma figura encapuzada permanecia imóvel, observando tudo em silêncio. Seus olhos não estavam voltados para o anúncio, mas para a multidão. Havia uma intensidade em seu olhar, uma resistência silenciosa. Nossos olhares se cruzaram por um breve momento, e foi como se o tempo parasse. Ela sabia algo que eu não sabia, mas que talvez estivesse prestes a descobrir.

Antes que pudesse me aproximar, o som do anúncio cresceu, preenchendo todo o espaço com uma melodia hipnótica. A multidão começou a se mover como um único corpo, seguindo as ordens invisíveis que vinham do alto. Mas, por alguma razão, meus pés não se mexeram. Fiquei parado, enquanto as figuras à minha volta desapareciam no fluxo do espetáculo, até que a praça ficasse quase vazia, exceto pela mulher de capuz.

Ela se aproximou lentamente, com passos leves, e antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, murmurou, como se soubesse o que eu estava pensando: “Você vê, não é? Os fios… eles estão nos apertando.”

Sua voz, baixa e rouca, trouxe uma estranha sensação de alívio e desconforto ao mesmo tempo. Fiquei imóvel, aguardando o que viria a seguir, sabendo que, de alguma forma, esse encontro era o início de algo que jamais poderia ser revertido.

“O que você vê está apenas começando,” ela continuou, enquanto o brilho da cidade ao nosso redor parecia vacilar por um instante, como uma lâmpada prestes a queimar. “Se você quiser, posso te mostrar o que há além do espetáculo…”

Mas, antes que ela pudesse terminar, o som de passos pesados se aproximou rapidamente.T

Antes que ela pudesse completar a frase, o som de passos metálicos preencheu a praça. Agentes de segurança, com suas armaduras reluzentes e visores opacos, se aproximavam em formação, sem pressa, mas com a precisão de um relógio. A mulher encapuzada deu um leve sorriso de canto, como se aquilo já fosse esperado.

“Eles chegam rápido quando alguém começa a ver demais”, disse ela, com um tom de desdém contido.

Os agentes nos cercaram sem dizer uma palavra. Um deles estendeu a mão, oferecendo um pequeno dispositivo prateado, brilhante como todas as promessas que pairavam no ar. “Por favor, aceitem a atualização. Vai facilitar suas vidas.”

O sarcasmo que ele não precisou dizer estava implícito na própria oferta. A mulher olhou para mim e balançou a cabeça levemente, como quem já conhecia o final daquela peça. Sem outra opção, ela pegou o dispositivo e olhou uma última vez para mim, seu olhar carregado de ironia e uma ponta de tristeza.

“Bem-vindo ao grande show”, murmurou ela, antes de desaparecer entre os agentes.

Eu permaneci parado, com o dispositivo em minhas mãos, sentindo o peso das escolhas que nunca tive. O mundo ao meu redor voltou ao ritmo normal, o brilho das propagandas reavivou-se, e a melodia hipnótica da praça recomeçou como se nada tivesse acontecido. A multidão, que havia sumido, agora retornava, suas faces já pré-moldadas e prontas para mais um dia de espetáculo.

Olhei ao redor, sabendo que, de uma forma ou de outra, eu também seria absorvido pela roda. A vida se desenrolava como sempre, as luzes brilhavam, os sons preenchiam o ar, e, como bons espectadores, continuávamos aplaudindo.

Afinal, quem seria tolo o suficiente para querer sair desse show tão bem produzido?

Renato Pittas   

Contato:[email protected]

https://sara-evil.blogspot.com

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