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Curto e Grosso

Curto e Grosso

Era uma cidade como qualquer outra, mergulhada em suas rotinas, mas, por baixo da superfície dos edifícios de vidro e das ruas movimentadas, havia um segredo antigo e esquecido. As mulheres daquela cidade tinham um poder que os homens ignoravam, algo que pulsava no sangue delas, mas não era uma maldição, como os mais antigos patriarcas sugeriam. Era, na verdade, um ciclo de renascimento.

Na aurora dos tempos, os homens olharam para as mulheres com medo e desprezo. Elas sangravam, e para eles, aquilo parecia uma fraqueza, um sinal de impureza. Não entenderam que, com cada gota perdida, o corpo feminino se renovava, fortalecia-se, limpava-se de dentro para fora. Era um processo de preparação, de purificação, não para os homens, mas para a própria vida que as habitava. Esse ciclo, perfeito em sua simplicidade, desafiava a lógica daqueles que precisavam de poder e controle.

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O patriarcado, com suas fantasias de domínio, construiu muros ao redor dessas mulheres, transformando o que não compreendia em algo a ser controlado. O sangue, símbolo de força e continuidade, foi interpretado como fraqueza e sujeição. Eram tratadas como inferiores, escravas dos escravos, presas dentro de narrativas que as reduziam à servidão, à obediência, ao medo de um poder que nunca existiu.

Os homens, incapazes de lidar com seus próprios desejos, com suas inseguranças, transferiram essas angústias para as mulheres. Criaram regras, dogmas e fantasias de controle. Abusaram de quem os trouxe ao mundo, esquecendo-se de que, no fundo de tudo, estavam tentando dominar o próprio medo. O desejo, mal compreendido, se transformou em violência. E o ciclo continuava: a opressão se repetia, geração após geração, como se a própria história estivesse presa a uma corrente inquebrável.

Mas as mulheres, as raízes da existência, nunca deixaram de compreender o poder que tinham. No silêncio de suas lutas, sabiam que o sangue que carregavam era fonte de vida, não de submissão. A cada ciclo, mesmo que subjulgadas, resistiam, pois entendiam que seu valor vinha da capacidade de gerar, de transformar e de resistir, enquanto aqueles que as oprimiam apenas reproduziam o medo.

E ali, entre as ruas, por trás das fantasias de poder, as mulheres, apesar de todas as tentativas de dominação, permaneciam inabaláveis. Elas sabiam que, em algum momento, a história contada de cima para baixo perderia sua força. E que, no fundo, a verdadeira origem da vida, do poder e da resistência estava nelas, no sangue, na dor, mas, sobretudo, na força invencível de continuar existindo e renovando-se.

Renato Pittas   

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