O Viajante
Em um mundo onde a comunicação se fragmenta em mil tons e cores, em que cada palavra é uma chave para realidades divergentes, um viajante se encontra à deriva. Este não é um viajante comum, mas alguém que explora as dobras do tempo e da mente, um ser que caminha entre a realidade e a fantasia, entre o passado e o presente. Sua jornada não é física, mas uma travessia de palavras, de ideias e de emoções que se desdobram em cada fonema.
Este viajante, que não tem nome, mas é conhecido por muitos, sente o peso de uma doutrinação alienígena que invade sua mente. As palavras que deveria dizer para expressar o que realmente sente e pensa são distorcidas, moldadas por forças invisíveis que manipulam o entendimento. Se percebe bombardeado por informações que não lhe pertencem, por ideias que não são suas, mas que se infiltram em seus pensamentos como parasitas, sugando a autenticidade de seu ser.
Em meio a tantas contradições, se sente perdido. Vê os outros ao seu redor, também vagando, cegos pela luz brilhante do algoritmo que os guia, uma inteligência artificial que serve apenas aos interesses daqueles que a programaram. Ele percebe que essa força, embora pareça ter controle absoluto, é alimentada por uma compreensão limitada e interesseira, que transforma pessoas em massas de manobra, moldando suas percepções para um objetivo que não é o seu.
Mas sabe que a visão do mundo por olhos alheios é incompleta, distorcida. Tenta resistir, tenta lembrar quem é em meio a tantos estímulos contraditórios. Sabe que há uma verdade mais profunda, uma realidade Sabe que já esteve aqui antes, que já lutou contra essas mesmas forças, mas as palavras que usou então se perderam no tempo, diluídas na corrente interminável de informações.
Mesmo assim, continua a tentar. Cada palavra que diz é uma tentativa de reconectar-se com essa verdade, de romper as correntes da alienação. Sabe que pode parecer em vão, que as memórias podem se desfazer, que a descrença pode ser forte, mas não desiste. Segue adiante, navegando pelo mar de fonemas, tentando, de alguma forma, expressar o que sente, o que sabe ser real, mesmo que tudo ao seu redor tente convencê-lo do contrário.
E assim, avança, uma figura solitária em uma paisagem feita de palavras, de ideias, de emoções. Ele sabe que sua jornada é eterna, que nunca encontrará um fim, mas isso não o desanima. Pois ele é um viajante de palavras, e enquanto tiver voz, continuará a buscar a verdade, por mais escondida que ela esteja, por mais difícil que seja encontrá-la em meio à cacofonia do mundo.
À medida que avança, a paisagem ao seu redor começa a mudar. As palavras que antes formavam um mar revolto de significados começam a se reorganizar, como se obedecessem a uma nova lógica, um ritmo diferente. Percebe que as frases que antes o cercavam, carregadas de contradições e mensagens fragmentadas, agora se tornam mais claras, mas também mais sutis, como uma melodia que ele pode quase ouvir, mas que nunca atinge seu clímax.
Cada passo que dá é acompanhado por uma sensação de déjà vu, como se estivesse percorrendo um caminho que já conheceu em outras vidas, em outras realidades. Sente que as palavras, os fonemas que agora flutuam ao seu redor, são ecos de algo mais profundo, algo que transcende o tempo e o espaço. Nnão são apenas palavras, mas vestígios de memórias antigas, de experiências vividas em eras passadas, talvez até mesmo em outros mundos.
Então percebe que está se aproximando de uma cidade, uma metrópole construída não de pedra ou aço, mas de pura linguagem. As ruas são formadas por sentenças entrelaçadas, as paredes dos edifícios são compostas por parágrafos inteiros, e as luzes que iluminam a cidade piscam em um código semântico que não consegue decifrar completamente. É uma cidade viva, pulsante, construída a partir das mentes daqueles que, como ele, já tentaram entender a realidade por meio das palavras.
Dentro dessa cidade, encontra outros como ele, figuras que parecem ser reflexos de sua própria busca. Eles também estão perdidos em suas tentativas de articular o inarticulável, de dar forma ao que é intangível. Mas ao contrário dele, muitos já se resignaram, aceitando as palavras que lhes foram impostas pelo algoritmo, vivendo suas vidas em ciclos de repetição, prisioneiros de uma linguagem que não lhes pertence.
Passa por essas figuras com uma sensação crescente de urgência. Sabe que não pode se permitir cair na mesma armadilha, sabe que precisa continuar a buscar, mesmo que o que procura seja apenas uma sombra de uma verdade maior. A cidade, com toda a sua complexidade e beleza, é também um labirinto, um quebra-cabeça que desafia sua compreensão. Cada esquina que vira revela novas contradições, novos enigmas, e ele sente que está sendo testado, como se algo ou alguém quisesse ver até onde ele é capaz de ir.
Finalmente, chega ao centro da cidade, onde se ergue uma torre imensa, composta de palavras que se entrelaçam em padrões impossíveis, formando uma espiral que parece alcançar o próprio céu. Sabe que precisa subir essa torre, que no topo dela está a resposta que busca, ou pelo menos um vislumbre do que ele procura. Com determinação renovada, começa a escalada, cada passo um desafio contra as forças que tentam derrubá-lo.
À medida que sobe, as palavras ao seu redor se tornam mais complexas, mais carregadas de significado. Sente o peso de cada fonema, como se cada um contivesse um universo inteiro de experiências, de memórias que mal pode compreender. Mas continua, sabendo que, mesmo que nunca alcance o topo, a própria jornada é o que importa, a busca incessante pela verdade em meio ao caos da linguagem.
Finalmente, após o que parece uma eternidade, chega ao último degrau. Ali, no topo da torre, se depara com uma figura feita de pura luz, um ser que parece ser a personificação de todas as palavras que ele já conheceu, de todas as ideias que já tentou articular. A figura olha para ele, e ele sente que está prestes a receber a resposta que tanto procurou.
Mas, ao invés de uma revelação grandiosa, a figura simplesmente sorri e desaparece, deixando-o sozinho no topo da torre. Oha ao redor, para a vastidão do mundo abaixo de si, e percebe que, embora não tenha encontrado a resposta definitiva, a própria busca o transformou. Não é mais o mesmo que começou essa jornada. As palavras que ele tentou dizer, as que ele nunca conseguiu expressar plenamente, agora fazem parte de quem é, de sua essência.
Então, com um último olhar para o horizonte, começa a descida. Sabe que há outras cidades, outras torres, outros labirintos de linguagem esperando por ele. Embora nunca possa realmente compreender tudo o que procura, Também sabe que a busca nunca é em vão. Pois em cada palavra, em cada fonema, há um fragmento da verdade que tanto deseja, e enquanto continuar a procurar,Nunca estará realmente perdido.
À medida que o viajante desce a torre, o caminho à sua frente começa a se dividir, multiplicando-se em diversas direções, cada uma levando a um destino diferente. Ele percebe que não há um único caminho a seguir, mas uma infinidade de possibilidades, cada uma representando uma versão diferente de sua própria jornada. Aqui, as realidades se bifurcam, e o final de sua história é tecido por suas escolhas, pela complexidade da linguagem e pelos mistérios do universo que o rodeia.
O viajante, ao descer, encontra uma porta que o leva de volta ao ponto inicial de sua jornada. Ao atravessá-la, se vê na mesma planície onde começou, mas agora com uma compreensão renovada. As palavras que antes o confundiam agora se organizam em uma sinfonia harmoniosa em sua mente. Percebe que, embora tenha voltado ao início, está transformado, e que a verdadeira jornada foi interna, uma exploração de si mesmo. Ele se senta à sombra de uma árvore, fecha os olhos e finalmente encontra paz, sabendo que as respostas que buscava sempre estiveram dentro dele.
Enquanto desce, o viajante percebe que a torre não é apenas uma estrutura física, mas uma entidade viva, consciente. Se sente atraído por ela, como se suas palavras e pensamentos fossem absorvidos pela própria torre. Decide se unir a ela, entregando-se à sua essência. À medida que suas palavras e memórias se fundem com a estrutura, se torna parte da torre, um guardião das verdades que ela guarda. Agora, ele é a voz silenciosa que sussurra segredos para aqueles que se atrevem a escalar seus degraus, mantendo viva a busca pela verdade.
Outra realidade o leva por um caminho onde ele nunca para de descer, cada degrau levando a mais degraus, como uma escada infinita. Nesse destino, continua sua jornada, movido pela incerteza e pelo desejo constante de entender o que não pode ser compreendido plenamente. Aceita que sua busca é interminável e que o verdadeiro significado está no próprio ato de buscar. Cada novo degrau revela uma nova perspectiva, uma nova camada de compreensão, e segue, eternamente curioso, sabendo que nunca atingirá o fim, mas que a caminhada é, por si só, a sua resposta.
O viajante desce até o nível mais baixo da torre e encontra uma sala vazia, onde o espaço e o tempo parecem se dissolver. Sente seu corpo se desintegrar, suas palavras se desfazendo em poeira cósmica, misturando-se ao fluxo eterno do universo. Se torna parte de tudo, uma energia fluida que se espalha por todo o cosmos, sem identidade, sem forma. Sua jornada se completa em uma fusão com o todo, onde não há mais perguntas, nem respostas, apenas a existência pura e incondicional.
Por fim, desce a torre e encontra uma bifurcação. Ao escolher uma das trilhas, ele emerge em um novo mundo, uma realidade diferente da que conhecia. Percebe que suas palavras e memórias foram reorganizadas, e que ele agora é uma nova entidade, em um novo corpo, vivendo uma nova vida. Carrega fragmentos de sua jornada anterior, mas agora seu caminho o leva por outros desafios, outras descobertas. Em cada novo mundo que adentra, ele renasce, com uma nova missão, uma nova história para contar.
Essas múltiplas possibilidades não são conclusões definitivas, mas aberturas para novas jornadas. É, em essência, um ser de possibilidades infinitas, e sua história nunca realmente termina. Cada escolha, cada caminho, leva a um novo começo, e continua, eternamente em busca, eternamente em transformação.
Renato Pittas
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