.
.

Talvez eu morra de fome, conteúdo ou do diabo à quatro, talvez, eu morra de novella.

Talvez eu morra de fome, conteúdo ou do diabo à quatro, talvez, eu morra de novella.

As palavras ecoavam no vazio de uma mente saturada, onde pensamentos se entrelaçavam em um labirinto sem saída. A monotonia se estendia como uma névoa densa, onde cada movimento parecia ser uma repetição interminável do anterior. A televisão zumbia ao fundo, como um aparelho de tortura moderna, transmitindo incessantemente a mesma programação enlatada. A “grande família” desfilava suas banalidades, os rostos sorridentes se misturavam à tristeza oculta, uma miséria disfarçada de felicidade cotidiana.

Eu quero microfonia; mísera miséria, eu quero microfonia!

Continua após a publicidade...

A voz interior gritava, exigindo algo mais, algo que quebrasse a letargia, que rasgasse o véu da normalidade. O desejo por microfonia – um ruído, uma distorção que trouxesse a dissonância necessária para despertar do torpor, era quase palpável. Mas a microfonia não vinha. O silêncio se estendia como uma condenação.

Dinâmica microfônica-televisiva, a grande família e o dia que passou!

O dia escoava pelo ralo da existência, uma sucessão de horas sem sentido, alimentada por uma dieta de imagens vazias e sons reciclados. A dinâmica entre o microfone e a televisão era uma dança de ilusões, onde as vozes se sobrepunham, mas não comunicavam. O desejo de gritar, de fazer-se ouvir, de quebrar o ciclo, era sufocado pela ausência de resposta. Onde estava a microfonia que deveria interromper essa farsa?

Miséria!

O grito se espalhava pelo quarto, ecoando nas paredes desprovidas de alma. A miséria não era apenas material, mas existencial. Era o vazio de significados, a ausência de propósito que corroía lentamente. Do outro lado do mundo, ou talvez do outro lado da cidade, alguém morria de frio, de sede, de fome… de desejo. E aqui, morria-se de monotonia, de conteúdo mastigado, de novela.

Cadê a microfonia que não acontece?

A pergunta pairava no ar, sem resposta. Talvez não houvesse microfonia, talvez o som necessário para quebrar a monotonia nunca viesse. A miséria, em sua forma mais pura, era a falta de mudança, a impossibilidade de alterar o curso dos acontecimentos. Era a morte lenta da criatividade, sufocada por uma realidade que não permitia desvios.

  • Miséria.

O ciclo se repetia, uma e outra vez, como uma fita cassete em loop. Talvez o único escape fosse aceitar a miséria como parte da existência, abraçar a monotonia até que ela se tornasse familiar. Ou talvez, apenas talvez, o grito abafado dentro da mente um dia rompesse o silêncio.

Mas, por enquanto, a microfonia continuava a não acontecer. E a miséria… bem, ela persistia.

Talvez eu morra de fome, conteúdo ou, do diabo à quatro, talvez, eu morra de novella.

E assim, a história continuava, sem conclusão, um eco constante de uma busca que nunca se completava…

As sombras alongavam-se nas paredes, como se o próprio tempo estivesse se arrastando para fora do presente, diluindo-se no passado. A grande família, ainda sorridente na tela, começava a perder seus contornos, derretendo-se em uma massa indistinta de rostos que já não se distinguiam entre si. O zumbido da televisão transformava-se em um ruído branco, tão penetrante quanto as dúvidas que permeavam cada pensamento.

Talvez eu morra de fome, conteúdo ou, do diabo à quatro, talvez, eu morra de novella.

A frase repetia-se na mente, como um mantra de desespero. Mas e se a morte não fosse o fim? E se, em vez disso, fosse apenas uma transformação, uma mudança de forma, uma transição de uma miséria para outra? A mente, ansiosa por respostas, começava a divagar, a flutuar entre realidades alternativas onde a fome era de ideias, o conteúdo era vazio e a novela… bem, a novela nunca terminava, estendendo-se em um ciclo perpétuo de reviravoltas previsíveis.

Eu quero microfonia; mísera miséria, eu quero microfonia!

O grito, agora interno, ecoava com ainda mais força. A necessidade de dissonância, de um choque que abalasse os sentidos, tornava-se uma obsessão. Mas, ao mesmo tempo, havia o medo de que a microfonia, se viesse, trouxesse consigo algo ainda mais insuportável. E se o ruído fosse tão avassalador que destruísse as poucas certezas que restavam? E se, em sua intensidade, a microfonia revelasse uma verdade que não poderia ser suportada?

O dia continuava a passar, mas agora parecia que estava se distorcendo, como se a própria noção de tempo estivesse se desfazendo. Os minutos escorriam como areia entre os dedos, enquanto a grande família na tela tornava-se um símbolo de algo muito maior, algo que estava além do alcance da compreensão. A televisão, antes um simples aparelho, transformava-se em um portal para outra realidade, uma realidade onde a miséria era o único denominador comum.

Miséria!

A palavra reverberava, ganhando vida própria, preenchendo o espaço vazio com sua presença opressiva. A miséria deixava de ser apenas um estado de espírito, transformando-se em uma entidade tangível, uma figura sombria que pairava sobre tudo, consumindo as esperanças e os sonhos. E, no entanto, havia uma estranha familiaridade nela, como se fosse uma velha amiga que sempre esteve por perto, esperando o momento certo para se manifestar.

Cadê a microfonia que não acontece?

A pergunta tornava-se quase um lamento, uma súplica por algo que nunca chegava. A mente, desesperada por um som que rompesse o silêncio, começava a criar sua própria microfonia, um ruído interno que ressoava com as frustrações acumuladas. Talvez a verdadeira microfonia estivesse dentro, um som que só poderia ser ouvido quando todas as outras distrações fossem removidas.

  • Miséria.

E assim, a miséria continuava, um ciclo interminável de busca e frustração, onde cada tentativa de fuga apenas levava de volta ao ponto de partida. Talvez a única saída fosse aceitar a miséria como parte intrínseca da existência, parar de lutar contra ela e, em vez disso, aprender a conviver com seu peso.

Mas mesmo essa aceitação parecia inatingível, pois a mente continuava a buscar, a questionar, a gritar por uma microfonia que não se manifestava. O ciclo recomeçava, sem fim à vista, um labirinto de pensamentos que se entrelaçavam em um nó impossível de desatar.

A história permanecia inconclusa, um eco constante de uma busca que nunca se completava, uma microfonia que continuava a não acontecer, e uma miséria que, apesar de tudo, persistia…

Assim, a narrativa se estende, uma linha contínua de palavras que desafiam a conclusão, uma dança entre o sentido e o vazio, onde a microfonia pode ou não se manifestar.

As palavras começavam a se desfazer, transformando-se em fragmentos desconexos que flutuavam na mente, perdendo-se em um turbilhão caótico de pensamentos. O quarto, antes silencioso, agora reverberava com sons distorcidos – ecos do passado, estalos do presente, sussurros de um futuro inexistente. As paredes pareciam se aproximar, dobrando-se sobre si mesmas, enquanto a televisão emitia um ruído agonizante, uma microfonia distorcida que finalmente se manifestava, mas não como esperado.

Eu quero microfonia; mísera miséria, eu quero microfonia!

O grito, antes interno, explodiu para fora, reverberando em múltiplas direções, como um coro dissonante de vozes desesperadas. A grande família na tela começou a se despedaçar, os rostos se dissolvendo em manchas de cor que escorriam como tinta fresca. O som se intensificava, crescendo em volume até preencher cada canto do espaço, cada pensamento, cada respiração. O caos tomava conta, e a mente, antes contida, se fragmentava em mil pedaços.

As palavras se tornavam irreconhecíveis, um emaranhado de sílabas sem sentido que se misturavam com imagens de rostos borrados, rostos que riam, choravam, gritavam em silêncio. O dia que passou se estilhaçava em mil estrofes desconexas, fragmentos de lembranças e ilusões que se embolavam em uma dança grotesca. A realidade e a ficção se fundiam, colidindo em uma explosão de cores e sons que não faziam mais sentido.

Miséria!

A palavra, antes carregada de peso, agora se multiplicava em gritos de agonia e riso insano. Miséria! Miséria! Miséria! Ela reverberava em todas as direções, distorcendo o espaço e o tempo, transformando tudo em um turbilhão de formas sem forma, de pensamentos sem pensamento. O caos reinava absoluto, enquanto a microfonia finalmente tomava conta de tudo, um rugido ensurdecedor que apagava a existência.

Cadê a microfonia que não acontece?

A pergunta se tornava uma piada cruel, ecoando em um vazio onde o som era o único soberano. A microfonia estava ali, finalmente, mas em sua chegada, trazia consigo a destruição, a desintegração completa de tudo o que era familiar. A realidade desmoronava, fragmentando-se em pedaços que rodopiavam no vórtice do caos.

  • Miséria.

E no meio do caos, no auge do som, no ponto de ruptura, tudo parou. O som se extinguiu de repente, deixando apenas um silêncio absoluto, um vácuo onde antes havia confusão. Mas esse silêncio não era um alívio – era a ausência total, o fim de todas as coisas. A história não tinha fim, porque a própria narrativa havia sido devorada pelo caos.

Talvez a microfonia tivesse finalmente acontecido, mas sua chegada havia consumido tudo. A história, a mente, o espaço – tudo se desfez em um final que não era um final, mas um colapso, uma implosão de sentidos e significados.

Mas agora, já não havia mais nada. Apenas o eco de uma miséria que deixou de existir.

Renato Pittas   

Contato:[email protected]

https://sara-evil.blogspot.com

Venda Livro Tagarelices: https://loja.uiclap.com/titulo/ua60170/

asbrazil

Deixe um comentário

SiteLock